Junho na Bahia, é milho à mesa

Diz a tradição popular que o milho deve ser plantado no mês de São José, março, para ser colhido no São João, junho. O milho é um dos cereais que está mais presente em todo mundo.

O milho é fundamental nos nossos sistemas alimentares de brasileiros, e por isso encontramos muitas formas de interpretar este cereal nas receitas familiares e nas comidas de rua.

Algumas comidas de milho são especiais para celebrações religiosas, nas festas populares e tradicionais; e assim marcam cardápios, recuperam memórias simbólicas e afetivas que estão presentes nos sabores, nas formas, nas estéticas de cada prato.

Da pipoca à polenta; do aluá ao mugunzá; do bolo de milho ao lelê de milho; do angu ao acaçá; do mingau ao cuscuz; vivem-se muitas opções quando se come o milho, seja nas casas, nas feiras, nos mercados, nos restaurantes, nos tabuleiros, no food truck, nos bares, nas confeitarias; e em outros lugares que preservam receitas e mostram a criação brasileira.

Nesses ricos cardápios de comidas de milho, há comidas salgadas e doces, há bebidas artesanais.  E muitas destas receitas interpretadas pelo olhar e sentimento dos povos americanos, foram interpretadas também por africanos, e por lusitanos que levaram o ingrediente para a doçaria.

Receitas de milho misturado com: feijão, coco, cravo, canela, açúcar; carne verde, charque, embutidos, queijo, dendê; entre tantas outras maneiras de aproximar o milho aos hábitos cotidianos.

Há mais de 7000 anos, o milho é um cereal americano que revela diferentes usos, e traz sentimentos sagrados tão presentes nas antigas civilizações Incas, Maias, Astecas, entre outras civilizações das Américas.

 

Foto Jorge Sabino

 

O milho está nas memórias mais ancestrais e fundamentais das representações mitológicas do sol, do deus Sol, um elemento de poder e de sacralidade. Ainda, o milho representa o ouro na terra, ou a transformação do sol em ouro. E assim, comer o milho significa comer o sol, comer o ouro, e desta maneira dialogar com os deuses.

O nosso Zea mays foi a planta de maior expansão entre os continentes e os povos do mundo. O mundo come muito milho, digam-se de diferentes maneiras, estilos, e representações culturais, que são reveladas nas receitas, nas técnicas culinárias, e nos modos de servir; assim se confirma uma base alimentar que nutre milhões de pessoas. São centenas de tipos, de formatos, e de cores dos grãos, para atestar a rica biodiversidade que convive com os tipos de milho transgênico.

Com este amplo cenário de “milhos”, vive-se em junho, na Bahia, a partir das festas de Santo Antônio, São João e São Pedro, os cardápios especiais para celebrar com comidas feitas à base de milho a devoção religiosa nas festas das casas, das ruas, dos terreiros de candomblé, e de muitos outros lugares. A Bahia celebra junho à mesa com as comidas de milho e revive receitas milenares americanas como a pamonha.

E não só o milho celebra o São João, mas também as fogueiras que lembram o sol e a purificação.  Assim são simbolizadas as devoções aos santos de junho, e também aos orixás Xangô e Iansã que se integram neste amplo e diverso sentimento de sagrado e de fé coletiva afro-baiana.

Raul Lody

(Originalmente publicado no Jornal A TARDE, Bahia, em 23 de junho)

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