A exibição de comidas em lugares estrelados, a ostentação de mesas de banquetes; a preocupação com nomes de chefes famosos, com restaurantes e bares da moda; e, os festivais de comida que têm grande apelo midiático fazem os melhores ingredientes e os melhores apelos para agregar status, e outros valores que possam localizar fama e prestígio para uma comida.
Nos contextos mediáticos, cada vez mais, a comida, e tudo que esta agregado a ela, ganha o seu melhor sabor de sucesso com o reconhecimento das redes sociais, porque comer a comida, muitas vezes, torna-se dispensável, pois o mais importante é fotografar a comida, quer dizer fotografar-se com a comida.
Estes tão fortes apelos sociais, e certamente econômicos, estão vinculados também a quantidade e a variedade de programas nas diferentes mídias e nas redes sociais que têm sempre com o tema central a comida.
E a comida é vista, é posta ao grande público como algo de consumo digital, e com fortes apelos ligados à espetacularização do produto. Assim, cada vez mais, os chamados programas de gastronomia ou de culinária ficam mais ‘bizarros’ e diversos, com as suas competições, com os seus apelos sexualizados. É um verdadeiro show de variedades, onde muitas vezes o que menos importa é a comida.
A comida-show chegou para ficar, a comida apresentada como algo fantástico, como uma sensação, como um objeto de desejo, não do desejo pelo sabor, mas o desejo de ter acesso ao sucesso simbólico, de fama, de lugar social que é afirmado pela comida.
E assim, a comida sai do prato e ganha o palco, algo para ser apreciado, algo para ser mais valorizado pelo que agrega na construção de um lugar de destaque da pessoa numa rede social, do que por aquilo que ela pode aprender se ela realmente tiver uma experiência real através dos seus próprios olhos, e da sua boca, e não apenas através das lentes do celular.
E atualmente, tudo isso é legitimado pelos muitos símbolos que a comida pode trazer, não na vida real, mas também no universo virtual, e que vai muito além dos seus ingredientes e dos seus processos nas cozinhas.
Pode-se dizer que se come refeições virtuais no cotidiano, porque ver a comida, apreciar a imagem da comida, interpretar a comida como uma obra de arte digital; e ter um registro de status social, e essa é a melhor parte do cardápio.
Comer a imagem da comida, sem muitas vezes tê-la sequer saboreado, é como um ter um acervo gastronômico pessoal para se alimentar simbolicamente.
Este emergente ritual contemporâneo de fotografar a comida, torna mais importante a imagem do que o ato de comer. E o compartilhamento da imagem ganha um valor de uma refeição, de um banquete virtual, tanto para quem fotografa quanto para que faz parte desta rede social.
A imagem, nesse caso, marca a pessoa e a sua conquista, seu prêmio, uma forma de distinção social a partir do tipo de comida, ou do lugar em que se entra para comer, mesmo que não se coma nada.
O acesso fácil e imediato a fotografia no celular alimenta a relação comida e imagem. E, sem dúvida, é na imagem que está o melhor texto visual, o maior sentimento de gosto, a mais verdadeira realização de posse do alimento; porém sendo todos estes vetores apenas virtuais, imagéticos.
A comida é uma forma de argumentação, e ela pode revelar diferentes desejos. Desta maneira, as imagens das comidas funcionam para comunicar, localizar, diferenciar; e, ainda, determinar individualidade. As escolhas e as composições fazem com que, a partir da relação entre a pessoa e a comida, crie-se uma identidade. Assim, cada hábito alimentar se relaciona com um estilo de vida ou modo de consumo, e isto mostra um conceito sobre a pessoa, a sua alimentação, e a sua cultura. E aí se pode entender como a pessoa se relaciona simbolicamente com o que come e por quê.
Todos esses argumentos estão relacionados à comida, que é antes de tudo uma imagem que provoca desejo, ela é um descritivo visual de sabor, de conhecimento, de cultura, de identidade; também do desconhecido; e precisa ser vivida no mundo real para que haja uma verdadeira interação, um verdadeiro compartilhamento. E não apenas uma vinculação de destaque da imagem pessoal numa rede social.
RAUL LODY