Está nos nossos hábitos alimentares comer a farinha de mandioca. Farinha pura sobre o feijão, ou misturada com outros ingredientes. Ela é usada tanto para preparos culinários salgados quanto doces.
E a partir da farinha surge uma receita que é celebrada nacionalmente, a farofa. A sua base é um tipo de farinha seca que é misturada a um ou mais ingredientes, que podem ser também secos, ou úmidos como as gorduras, sejam vegetais ou animais.
Também, além da farinha de mandioca, essa base da farofa pode ser de farinha de trigo, farinha de pão, farinha de milho ou o aproveitamento do cuscuz de milho, onde, na presença ou ausência de aquecimento, acrescenta-se um ou mais ingredientes, doces ou salgados. Ainda, a farofa pode ser mais seca ou mais úmida, o que vai variar de acordo com a receita.
Entretanto, são as receitas à base de farinha de mandioca que atestam a nossa identidade alimentar brasileira. Porque a farinha de mandioca é uma preferência nacional, seja na farofa, no pirão ou em outros usos.
A farofa é nacional, mas é também regional, e assim se cria as suas diferentes identidades, por exemplo, com a farinha seca e o azeite de dendê temos a farofa vermelha, farofa de dendê.
E a partir da regionalização da farofa, surgem diferentes opções de misturas da farinha, que vão da abóbora cozida até a carne seca desfiada. São muitas as receias de farofa que mostram o modo de comer à brasileira.
Sem dúvida, o brasileiro é um “comedor de farinha”, um apreciador da farinha de mandioca, e há uma espécie de intimidade com a farinha, já se tem uma quase especialização na prática da escolha deste ingrediente.
Fina ou grossa; branca ou amarela; mais torrada ou menos; temperada com coco, com pimenta, com açafrão; são muitos os tipos de farinhas, e cada um com sua variedade, e todos são celebrados nas nossas farofas.
A farofa está presente em diversos cardápios que são organizados com carnes, aves, legumes e peixes. Além de ser delicioso colocar no prato, sobre o molho da galinha de cabidela, a farinha e fazer uma farofa na hora, ou amassar uma pimenta fresca e adicionar, ao gosto, a farinha de mandioca.
Fazer a farofa é um ritual que se inicia no momento da compra da farinha, quando se verifica a textura e o sabor, e se forma o ideal aguardado do prazer e do sabor do momento da criação. É a mistura da farinha com outros ingredientes, um ideal de sabor que pode ser autoral.
Nem sempre a farofa é um acompanhamento, pois ela pode ser também o prato principal.
Pode-se misturar a farinha de mandioca com quase tudo: frutas, leguminosas, ovos; pimentas, peixes, aves, carnes; rapadura, melado; leite, açúcar, café; assim, a farofa nasce da criatividade de cada pessoa.
Mas nem tudo vira farofa, pois é muito comum usar a farinha de mandioca como uma verdadeira “liga” entre tudo que estiver no prato. Por exemplo, quando a comida é mole, como uma quiabada, a farinha dará uma consistência especial. Esta “liga” está numa mistura consagrada que é feijão, arroz e/ou ‘macarrão’ – espaguete –, um momento em que a farinha cria um verdadeiro elo entre os ingredientes, e dá identidade para este prato-feito.
De volta as expressões regionais de farofa, na Bahia, na área do Recôncavo, há a farofa de bambá. Uma farofa que reúne farinha de mandioca, cebola, sal e o bambá, que é a parte sólida do azeite de dendê.
Destaque para as farofas especiais dos cardápios das festas, como: a “farofa-rica”, que aproveita os “miúdos” bem temperados da ave que será assada; a farofa com frutas secas e cristalizadas que integram os cardápios de carnes assadas e de presuntos. Também, vê-se o uso das farofas como recheio para peixes que são assados inteiros, onde a farofa é acrescida com ovos, camarões, azeitonas, entre outros ingredientes. Já o “arrumadinho” é um caso culinário aonde a mistura do feijão com a farinha de mandioca, a carne seca e outros ingredientes, formam uma farofa que é considerada como um prato principal.
Assim, seja pela sua procedência, lugar, “terroir”, que determina o tipo, a variedade, a técnica, o estilo, e consequentemente o sabor, e o seu uso culinário, a farinha de mandioca acompanha o brasileiro no seu cotidiano, e marca a farofa como uma receita que lhe dá identidade que se expressa em muitos sabores.
Raul Lody